O governo já estipulou uma data no calendário para encerrar o pagamento do auxílio emergencial: dezembro de 2020. O que não se sabe é se o seu substituto, o Renda Brasil, estará pronto até janeiro de 2021 e se o novo programa terá a mesma eficácia do primeiro no combate à pobreza.
A simples redução do auxílio de R$ 600 para R$ 300, como fez o governo na prorrogação do pagamento, já coloca em risco a capacidade de compra das famílias, principalmente as mais pobres. Para os 10% mais pobres da população, a diminuição implicará em uma queda da renda familiar per capita de 44%, segundo simulação feita pelo Ibre FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
O estrago é maior ainda quando o auxílio acabar de vez. Nesse cenário, a renda dos 10% mais pobres cairá 77%. Considerando os 30% mais pobres, o fim do benefício levará a uma diminuição da renda per capita familiar de 44%.
“Quanto mais pobre a família, maior foi o impacto do auxílio no aumento da renda per capita. Essas faixas serão as mais atingidas pela retirada do benefício”, afirma o pesquisador do Ibre/FGV Daniel Duque, autor do levantamento.
Como vai ser o impacto? O fim do auxílio não impacta na renda média das famílias mais ricas, confirmando a teoria de que o benefício foi um instrumento de combate à pobreza. A tabela abaixo mostra como será o impacto por faixa de renda:
Decil | Renda per capita familiar com auxílio de R$ 300 | Variação em relação a junho | Renda per capita familiar sem auxílio emergencial | Variação em relação a junho |
1 | 152,32 | -44% | 61,47 | -77,4% |
2 | 294,69 | -21,7% | 234,58 | -37,7% |
3 | 423,32 | -12,4% | 380,01 | -21,4% |
4 | 552,46 | -7% | 518,40 | -12,8% |
5 | 680,42 | -4,3% | 657,01 | -7,5% |
6 | 834,37 | -3% | 825,25 | -4,1% |
7 | 1045,36 | -1,2% | 1056,01 | -0,2% |
8 | 1325,48 | -0,8% | 1339,81 | 0,3% |
9 | 1904,14 | -0,2% | 1930,60 | 1,2% |
10 | 4868,14 | 2,3% | 4907,08 | 3,1% |
Que efeito o fim do auxílio deve trazer? Duque diz que se nenhuma medida compensatória for criada a partir de janeiro, os mais pobres sofrerão uma perda brutal de renda. Ou seja, os efeitos do auxílio na redução da pobreza deixarão de existir.
Qual foi o impacto do auxílio na redução da pobreza? Com o benefício, a pobreza extrema caiu ao menor nível no país em 44 anos, segundo levantamento do Ibre/FGV. Em maio, 4,2% da população vivia em situação de extrema pobreza, ou seja, com renda mensal per capita de US$ 1,90. Em junho, esse percentual havia caído para 3,3%.
Isso significa que a pobreza extrema subirá? Duque afirma que tudo depende de como vai se comportar o mercado de trabalho. “Tivemos níveis historicamente baixos de pobreza em 2020 com a ajuda do auxílio. Sem ele, a pobreza tende a aumentar.”
E qual vai ser o efeito disso para a economia? A expectativa é de queda no consumo. Vários setores registraram aumento de vendas durante a pandemia, muito por conta da injeção do auxílio. Mas seu fim coloca em dúvida a manutenção dessa curva de crescimento.
O problema é que o auxílio emergencial é um programa caro, que não pode ser mantido eternamente pelo governo. Na semana passada, o Ministério da Economia piorou suas projeções de déficit do setor público consolidado para R$ 891,1 bilhões em 2020 (12,4% do PIB). A última previsão era de um déficit de 11,3% do PIB.
Qual o custo do auxílio? O custo anterior era 254,2 bilhões. Com a prorrogação do pagamento até o fim do ano, esse gasto sobe para R$ 321,8 bilhões em 2020.